Os Imperdoáveis(Unforgiven, 1992) é o testemunho de Eastwood sobre tudo o que fez em sua carreira. Sobre apreciar o pôr-do-sol, sobre ser um...
Os Imperdoáveis(Unforgiven, 1992) é o testemunho de Eastwood sobre tudo o que fez em sua carreira. Sobre apreciar o pôr-do-sol, sobre ser um pai, sobre ser um matador mas principalmente sobre ser um homem. Talvez este seja o western mais humano de todos os tempos (e isso não desmerece os outros), e com certeza a prova genuína que Clint Eastwood é com certeza o homem que mais sabe transpor em linguagem simples, as memórias e a morte.
Logo no começo, vemos uma maravilha de paisagem da mesma forma como vemos mais tarde. Mas é sobre o discurso de vida, vingança e memória que Eastwood trabalha, sobretudo, por que é um homem que não se satisfaz com o “happy ending” principalmente por que este não existe. Nem tão pouco um homem otimista ou pessimista, Clint é realista, põem as cartas sobre a mesa, porém não fica contente com créditos, se aprofunda em mostrar as raízes de suas cicatrizes.
Em Três Homens em Conflito(Il Buono, Il Brutto, Il Cattivo, 1966), tudo o que acontece é rápido, as mortes são rápidas, o gatilho é rápido e quase não à dor(esse portal entre a vida e a morte, que é o que Clint, essencialmente trabalha aqui), mas existe para ele algo que não pode se negar ou esconder, sempre enfrentaremos ele, e em um inferno onde a humanidade não era civilizadamente hipócrita como depois foi virando, a justiça essa sim, era feita a base de sangue, e não existia ninguém que não sentia algum pingo de revolta – e isso, até hoje -, por que este é um sentimento selvagem mas totalmente pertencente a raça humana. Engraçado que as duas maneiras que terminam O Estranho sem Nome(High Plains Drifter, 1973) e Os Imperdoáveis(Unforgiven, 1992) são completamente iguais, mas há uma diferença, essa foi tocando aos poucos mais o coração do velho Clint, mais do que à critica a sociedade, foi trabalhando muito mais em suas marcas, independente da forma que são feitas, as cicatrizes de uma herança infernal não são esquecidas, por isso que não é atoa que o discurso religioso nada adianta para ajudar na resolução final, pois a mágoa guardada é inesquecível e principalmente irreparável.
Se em Gran Torino(idem, 2008), Eastwood volta para falar com o espectador sobre esse ressentimento(que para ele são transformados em extremos como em mal humor crônico ou em caretice calcada em alguma crença), em Os Imperdoáveis(Unforgiven, 1992) viajamos sobre o western para dissecar William Munny e um tempo que não é mais seu, aqui encaramos de frente a onda do tempo no peso de um homem do passado. Onde os tiros não são mais os mesmos, os cavalos não são mais os mesmo? Não. O Western não mudou, continua o mesmo, tem ainda aquele sol batendo sobre o chão desértico e seco para refletir nas grandes esculturas naturais, grandes pedras alaranjadas. É, tudo continua igual, mas o que não continua igual é o pensamento, que tanto Clint quer explorar, afundamos no tempo, mergulhamos no passado(sentimos o peso da bala como William e Ned) e vamos em frente para matar, ato bem compreensível para eles, mas que não é mais o que era antes, isso sim, mudou para eles.
Se Eastwood sempre pegava suas armas e apontava na cara de seus inimigos, vemos um dilema difícil, por que mais do que um Western, Os Imperdoáveis(Unforgiven, 1992) é um filme que filosofa sobre a vida, sobre a existência de uma humanidade complexa, que come, bebe, dorme e possui todo um outro pensamento, é uma parte da linha chamada de destino, que quando “interferida” é estranho por que em questão de segundos, em uma puxada de gatilho, a arma então faz a força dando impulso para uma simples bala perfurar o corpo deste humano e pronto. Tudo se acabou, uma fórmula simples e por vezes devastadora (fisicamente, pois “espiritualmente”, ela sempre é) que ocasiona na morte e o pior, esta pessoa nunca mais vai respirar, por mais que isso seja óbvio, é difícil por exemplo que o novato de Schofield(Jaimz Woolvett) aceite isso quando mata pela primeira vez um homem(Clint, gosta de analisar a juventude independente da época que for, pois o calejamento de um velho experiente é bem semelhante a experiência de um iniciante). É dessa violência que Eastwood questiona, não ela em si, mas suas consequências, para quem mata e para quem sofre.
Unforgiven vai além do que a bala atingiu – para o tio Clint, a bala perfura a alma -, não se satisfaz quando vê enfim um corpo de um homem(meu deus, nem sabemos o que é um direito), um ser inexplicável, em todos os lados como nós, que não sabe por que está ao mundo, mata, esfaqueia e principalmente se vinga, por que o último e final discurso de Eastwood não fica apenas para o sofrimento dessa toda tragédia que o sangue faz, mas sim do “troco”, a vingança que a mágoa fez perfurando o coração e aí sim, Clint volta para ser como era nos filmes de Sergio Leone, um homem maldito e sanguinário impiedoso. É um caminho sem volta, não é Clint que põe isso, ele apenas demonstra, isso é instinto selvagem, somos bichos, e como um dominó um cai atrás do outro, não existe moral nem regras, mas sim selvageria, por que somos uns com os outros assim, contudo, por que somos desse jeito? Clint Eastwood, embora um cineasta genial, não é um deus, não cabe a ele nem a nós respondermos, mas se dos últimos tiros, cavalgadas e até do som das esporas sabemos é que tudo termina em que Samuel Fuller diz sobre o significado de cinema; emoção.
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