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Tropa de Elite (2007) - Crítica

Fazer um comentário sobre o filme “Tropa de Elite” é algo por demais fácil e comum. Criticá-lo no entanto, ainda mais agora que o filme arre...



Fazer um comentário sobre o filme “Tropa de Elite” é algo por demais fácil e comum. Criticá-lo no entanto, ainda mais agora que o filme arrebatou o Urso de ouro pode soar como algo semelhante: “Olhe! O fulano quer aparecer”. Convém então que eu me posicione muito bem no que quero dizer. O filme em si (artesanalmente falando) beira a perfeição. Dá-nos a sensação de que assistimos a um documentário, tamanho o equilíbrio ente ficção e realidade. Ainda que sua ação se passe em 1997, sabemos que este “1997” persiste.
E encontrou José Padilha atores a altura dos papéis imaginados. Vagner Moura está perfeito como o policial transgressor (Capitão Nascimento). Esse policial está com a esposa aguardando o primeiro filho. Ele percebe que já não está conseguindo se dividir em dois (Uma espécie de “O médico e o monstro”) e que está trazendo os pesadelos que vive em seu ofício para dentro do lar. Quer então largar o posto, mas sua consciência lhe pede que deixe um substituto a altura ( alguém que não desperdice sua vida e tampouco utilize dos poderes de exceção do BOPE para fins pessoais). Sua predileção de início, recai sobre Neto Gouveia que age mais com o coração que com o cérebro. Neto é amigo de infância de André Matias. Nascimento desconfia de André, já que ele cursa a faculdade de direito de uma Universidade. Ou seja, ele também é tal qual Nascimento um homem dividido. Nascimento entre o lar e o seu ofício; Matias entre o que deseja, e a ascensão social. Na faculdade ele se confronta com os jovens da classe média (postos aqui como financiadores e perpetuadores de um sistema podre).
As cenas mais violentas do filme não ocorrem nas favelas. Ocorrem naquela sala de aula que André freqüenta na da faculdade. Ele é ali, o único não branco. É também um dos poucos que não corromperam seu corpo ao vício das “ervas”. Sabe que para terminar com o tráfico, mister se faz que não exista consumidores do que o tráfico oferece. Ele enxerga a raiz do problema, não a sua superfície. É claro que o discurso de quem pede esforço para mudar a ordem das coisa não será bem visto. Ele não é ignorado pelos jovens da classe média por ser fardado, tampouco por ser negro. Ele é ignorado por ter se mostrado superior a eles. 
Outro ponto extremamente positivo no filme foi o de mostrar a naturalidade do que ocorre nas dependências da polícia. E como tal ganha um aspecto de ter sido sempre assim. É esse chamado jeitinho brasileiro, que faz com que a coisa não ande. Se foi Neto que sentiu mais de perto a corrupção do sistema policial, foi Matias que a compreendeu para além da caserna.
Tivesse mantido esse seu olhar sutil sobre a vidinha dos boyzinhos ou dos meandros da polícia, teria nascido aí um marco do cinema tupiniquim. Infelizmente Padilha quedou-se a cair no popularesco. Era preciso fazer com que o discurso atingisse as massas. Para isso fez com que exorcizássemos nossas frustrações, fazendo com que vísssemos um grupo de torturadores e assassinos como heróis.
As interpretações precisas, o roteiro feito para agradar a todos, faz com que percamos o senso crítico e a obra venha a ser usada para justificar aquilo que todos criticávamos anos antes (a tortura). O pecado de Tropa de Elite é o de fazer com que enxerguemos o Capitão Nascimento como um herói, ou como dizem alguns: Um mal necessário. A tortura tem sempre de ser condenada, não importa quem seja a vítima ou o torturador. O filme é um marco de nosso cinema. Vários fantasiaram-se de policiais do BOPE no carnaval. Todos brincam de “Tropa de Elite”. Assim como Matias foi cooptado por um dos lados, perdendo a sua integridade, todos nós passamos a nos ufanizar com esse filme. Tropa de Elite incorre em erro ao fazer o discurso dos que pretendem extirpar o mal instalado na zona urbana do Rio. Esquece que foram eles próprios que criaram esse mal. Quer pela ação, quer pelo descaso.
PS: Fui um dos que se alegrou com a escolha do filme “O ano em que meus pais saíram de férias” para nos representar no oscar. Pelo menos ali, sabemos que existe um discurso (sutilíssimo é certo) do que é correto ou não. Ali, aparentemente a arte não será usada de forma imediata pelos que detém o poder (como dizia Pasolini, cedo ou tarde tudo é usado para que nada seja mudado). É um filme que permite um distanciamento ao contrário de Tropa de elite que é também uma obra muito bem construída, mas, que traz infelizmente uma mensagem perigosíssima. “O triunfo da vontade” verde-amarelo.

Escrito em 22/02/2008 por Conde Fouá Anderaos

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