É normal ver na TV, biólogos, especialistas convivendo com a natureza, os famosos Geographic Chann...
É normal ver na TV, biólogos, especialistas convivendo com a natureza, os famosos Geographic Channel, Discovery Channel e principalmente o Animal Planet, recheados de uma programação que inclui o nosso contato com o da natureza, seja com seres aquáticos, selvagens, exóticos. Mas, talvez, nunca tenha existido alguém que tenha amado, no máximo o equivalente, os animais como Timothy Treadwell.
É claro, que esse amor, se confunde também com a fuga da civilização, o medo, uma ligação especial. É aí, que o filme de Herzog vem para inverter o alvo do documentário. Não se trata de mais um registro, do tipo Animal Planet, sobre a vida dos outros animais, mas sim de nós mesmos, os animais mais complexos (?) e esse nosso contato com a natureza. É importante olhar então, que agora o alvo central é puramente Treadwell, o nosso protagonista e amante dos animais, dos ursos que assumem aqui a representação dessa natureza que tentamos manter contato, que destruímos, que nos destrói, que parece não cruel em relação ao ser humano, mas indiferente.
O que leva então, o jovem Treadwell a arriscar sua vida para se aproximar dos animais? De opiniões sinceras, outras mais sentimentais, o filme de Herzog rodeia. Porém, parece permanecer nessa pergunta dois pontos principais, que parecem cercar, indireta ou diretamente a obra e o próprio espectador; a ciência e a fé. Herzog não aborda espiritualidade ou religiosidade alguma – embora a certa parte, ela apareça no discurso de uma amiga próxima de Treadwell – mas esse tema se torna um dos centros, a partir da paz que o jovem Timothy parece sempre pregar em seus discursos gravados em meio a floresta. A ciência, por sua vez, vem por exemplo, do especialista, que perguntado por Herzog, responde racionalmente condenando os atos de Treadwell, onde o mesmo estaria interferindo no território daqueles animais e que ainda que com boas intenções estaria prejudicando os ursos.
O que quer afinal, Timothy longe e solitário na floresta? Para Herzog, nosso narrador, uma possível conclusão é tirada disso. Em busca, conosco, de informações, percebe que também se trata de isolamento. Os questionamentos de Herzog não parecem permear através do porquê Timothy tinha essa aproximação especial com os ursos (embora a resposta dos mesmos não fosse sempre simpática e tenha resultado tragicamente), mas sim da fragilidade daquele homem. Já se perguntaram, enquanto viam ou mudavam de canal, o porquê de tantos biólogos, especialistas, arriscarem suas vidas, se isolarem, conviver apenas com outros animais? Pode e deve não ser a mesma resposta para todos, mas para Treadwell, a civilização parece mais feroz, selvagem do que o ambiente dos ursos.
“O homem solitário é uma besta ou um deus”, disse Aristóteles. Qual dessas figuras Treadwell melhor se encaixa? No documentário de Herzog, nenhuma dessas duas. Herzog, definitivamente, prefere questionar, questionar, valorizar a dúvida, analisar as imagens como se fossem obras de arte pertencentes ao cubismo, com todos os seus lados e formas possíveis, do elogio à repreensão ao debate, a crítica. Ao meu ver, a que mais se encaixa para Treadwell, é a frase de Deleuze a Godard; “um homem solitário, mas muito povoado por dentro”.
Olá Ricardo,
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