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Sete Quartos, Cozinha, Banheiro... Imperdível (1984)

Viúva do também cineasta Jacques Demy, Agnès Varda foi, ao lado de seu marido e de nomes tais quais Jean-Luc Godard, François Truffaut, Clau...

Viúva do também cineasta Jacques Demy, Agnès Varda foi, ao lado de seu marido e de nomes tais quais Jean-Luc Godard, François Truffaut, Claude Chabrol, Alain Resnais e Erc Rohmer, um dos maiores expoentes daquele que viria a ser o mais importante dos movimentos cinematográficos já visto: a Nouvelle Vague. Porém, quase duas décadas se passaram desde o auge do movimento nos anos 60, e foi nesse ano de 1984 que Varda nos brinda com esse curta que apenas pode ser descrito como espetacular. 7P., Cuis., S. de B., ... à Saisir como no original inicia-se com a narração em off de um corretor imobiliário listando as qualidades de uma casa, que logo ficamos sabendo tratar-se de um antigo hospício que após fechado foi vendido a uma família. Tal família foi acometida por um desastre, que embora não seja devidamente explicado, não tem relação com a casa, mas que fez o preço do imóvel diminuir considerávelmente. Tal narração sobrepõe as imagens dos ambientes vazios dessa enorme casa. Logo, os corredores antes desertos, começam a se cobrir de vida quando vamos vendo relances da família que ali vivia e até mesmo dos internos do hospício. "Essas paredes têm vida" diz o corretor. "Essas paredes têm vida" diz Varda. Corretor e compradores nunca são mostrados. Os compradores nem sequer são ouvidos. Das pessoas que vemos na casa, pouquíssimo sabemos. Fatos como esses nos levam a crer somente que as verdadeiras protagonistas desse curta são as paredes. Paredes que viram tantas coisas acontecer, mas que apenas conhecem o que foi dito em sua presença. Mas essas não são paredes quaisquer. Elas compõem um organismo vivo e pulsante, capaz de sonhar e de ter suas memórias distorcidas. Quanto mais longínquos os eventos, menos claros eles são. Os moradores do período hospício são meros fantasmas cujas efígies opacas já se esvaem da memória daquele ambiente. Os eventos mais distantes são narrados de maneira menos clara, como em um diálogo na cama onde o marido reclama da esposa enquanto lê o jornal e a esposa reclama dos empregados enquanto lê a revista de fofoca. Um diálogo manipulado pela memória, que ao esquecer alguns pedaços, o preenche com outros. Ou então os eventos são saídos da imaginação daquele ambiente, como a cozinha industrial na qual os fogões e pias são cobertos de grama, com um peru vivendo ao lado de uma panela habitada por peixes dourados. Ou então no banheiro, que a casa sonha como sendo completamente forrado de penas. Mas, mesmo assim, ainda permeiam memórias reais, como a filha que infeliz com a casa quer fugir para levar sua própria vida, ou as crianças, que em fase de descobrir a sexualidade se divertem lendo livros de anatomia e contando os palavrões que conhecem. Tudo isso fora vivido por aqueles ambientes. Na aparente inocuidade dos sombrios corredores, existem muito mais segredos do que se pode imaginar. Isso é o que Varda pretende dizer com seu filme e isso é o que ela diz. Mas como se não apenas isso fosse o bastante, ela ainda faz questão de deixar sua marca pessoal na direção, e tal marca vem através da forma com que as narrações contadas pelos personagens surgem à tela por meio de bonecos, ou então através do posicionamento da câmera, sempre estática ou em movimentos uniformes e unidimensionais, e o mais destacável de tudo, através do uso da nudez, artifício muito arrincado no cinema americano mas bem mais usual no cinema europeu, sobretudo o francês, de uma maneira muito pouco convencional. Outra coisa a se destacar é o posicionamento que Varda confere ao espectador. Enquanto as narrativas convencionais tentam trazer o público para perto dos personagens, Varda insiste em nos colocar na condição de meros voyeurs. Nosso lugar não é aquele, e isso ela deixa bem claro. Quando vamos criando uma maior contato e uma possibilidade de embarcar na história, uma porta se fecha bem na nossa frente, nos lembrando de nossa condição voyeurística. Devo confessar que esse foi o meu primeiro contato com a diretora, mas acabou se tornando uma experiência tão magnífica que já ouso afirmar que ela possui todo o potencial para se tornar uma de minhas cineastas favoritas.

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