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Os Miseráveis (2012)

Informações obtidas em pesquisas na internet dão conta que essa seria a 42ª adaptação da obra de Hugo que ganha às telas. Impossível afirmar...



Informações obtidas em pesquisas na internet dão conta que essa seria a 42ª adaptação da obra de Hugo que ganha às telas. Impossível afirmar então com precisão se essa seria uma das melhores ou uma das piores. Eu mesmo vi somente quatro antes dessa. E também temos de levar em consideração que toda adaptação se constrói sobre uma simbiose frágil entre o ponto de vista sobre uma obra e a fidelidade ao autor. A favor de Hooper conta o fato que Hugo inspira, mas ele (o diretor) se vale de uma obra que se inspirou no romance. O musical composto por Claude-Michel Schönberg com libreto de Alain Boublil e letras de Herbert Kretzmer. Coube a William Nicholson dar forma ao roteiro cinematográfico. Quando adentrei ao cinema, aguardava algo bom e não temia pelo pior. E o filme me recompensou. Das versões que assisti a melhor adaptação do romance de Hugo (não fidedigna – o livro é gigante e dificilmente uma obra levada ao cinema ou teatro consegue ser fiel ao romance que o inspira). Mas “Os Miseráveis” está lá, sua essência ali permanece.

Sabemos que Hugo se valeu de suas memórias sobre a França e sua história para escrever o livro. Ele se encontrava exilado fazia mais de uma década e recriou sua Pátria (sobretudo Paris)de forma brilhante. Lógico que sobre a tela não veremos muito do detestável,

Difícil falar dessa obra sem se remeter a obra anterior de Hooper. Lá também ele havia decidido pela escolha do íntimo, mostrando o mundo exterior e seus rumores dentro de uma atmosfera acolchoada já que não havia um contato direto com a população. Um Palácio desértico, com habitantes como que perdidos, isolados naquela imensidão. Aqui também em “Os Miseráveis” o homem é que está no centro. Mais o universo que o cerca, apesar de grandioso, não o diminui. Desde a cena inicial, é o homem que está no centro do grandioso. É o homem que se torna o senhor do seu destino, e aceita o comandar. É isso que pregava Hugo. Então respeitando o musical, Hooper o reivindica, permite que o homem comande o espetáculo. A angústia, a combatividade, a coragem, o amor proclamado em canções e sublimado nas atitudes, filmados numa série de close-up e em canções sendo não somente cantadas, mas interpretadas, sentidas no seu sentido literário reforçando a característica da Universalidade e intemporalidade da obra de 1862.

Antes de se valer dos movimentos de câmera grandiloquentes e permanentes para dar uma ilusão de sentido e para antecipar assim qualquer acusação de simples teatro filmado, o diretor compreendeu que era nas almas que se centralizavam todos os combates de cada personagem (não somente aqueles restritos a barricadas), mas isso não o impediu de ir para certos planos mais largos, na mesma proporção mais magnífica e significativa que eles são de uma raridade avisada as vezes de um sopro épico e de uma beleza arrebatadora.

È puramente cinematográficas algumas cenas, sem ao menos lembrar qualquer influência teatral, como exemplo aquela onde um Jean Valjean recém-liberto vaga pela amplitude de uma montanha gelada meio desnorteado.

Convém, no entanto lembrar que o diretor mais do que criar cenários puramente fincados num realismo, preferiu a força do verbo alavancado pela busca de um realismo poético, que bebeu nas fontes de uma teatralidade aceita e reivindicada para nos brindar com uma poesia sombria adornada pelo domínio das cores azul, branca e vermelha com que os personagens preencem a tela.

Logicamente que os puristas irão questionar certas liberdades tomadas com relação ao romance. Valjean não ficou cumprindo a pena nas Galés, mas sim numa prisão. Um contramestre ao invés de uma freira puritana é que coloca Fantine na rua; Javert a prende (Fantine) por uma agressão física, quando o que ocorreu no romance foi devolver uma bola de neve que a feriu no peito. O pai de Marius acredita-se tenha sido salvo em Waterloo por Tenardier; Valjean e Cosette já viviam em Paris e quando Javert os descobrem é que irão por acaso se esconder no Convento da Rua Picpus. Poder-se-ia citar outras tantas liberdades, mas isso não vem ao caso. A realidade é que a essência do livro ali se encontra (como no filme de 1952, que é inferior a esse).

A força épica de uma obra que jaz esquecida é que comanda o filme. E quem sabe não trará novos leitores que aceitem a recompensa de encarar esse escrito. Hooper coloca o embate entre o homem que busca a redenção (Jean Valjean) e o outro que não acredita que as pessoas possam mudar (Javert). Mas não é só isso que vemos na tela. O perigo está ao redor de cada ser. Sobretudo aquele que nasce dentro de si próprio. E quando Javert crê poder estar errado, mostrando que a Lei levada a ferro e fogo é falha, esse tomba definitivamente (mostrando que todo fanatismo traz sérias consequências). Mais existem outros embates que não deixam de ser citados: O combate a miséria física, mas também o combate a miséria moral que permeia todas as classes sociais. O combate entre o amor e o dever social (para Marius). O combate dos amores contrariados (que assola Eponine).

Hooper assina uma obra corajosa e ousada na sua feitura. Ao optar por se manter fiel a crença de que a força das palavras cantadas e sentidas por quase 3 horas arrebataria o público. Esqueceu-se que esse público não está talvez habituado a tamanha ousadia. Mas cá entre nós, isso é uma falha? Então deveríamos continuar a dar tudo mastigado sem despertar nas almas a necessidade de se burilarem. Victor Hugo escreveu tal romance faz 150 anos. Na época foi criticado por se valer em certas passagens de uma linguagem popular. Não posso crer que ocorreu uma involução em um século e meio. O que não pode ocorrer é se servir ao Deus consumo.

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